O valor; a economicidade e o valor; a percepção da economicidade cria o valor subjetivo; o valor como catalisador dos ciclos econômicos.
Capítulo III - Doutrina Sobre o Valor
§1º. A natureza e a origem do valor dos bens:
Antes de discutirmos o conceito de "valor" na teoria mengeriana, devemos voltar ao conceito de economicidade. Vamos relembrar que, a economicidade é a característica definidora de bens que, por conta de fatores circunstanciais, possuem a sua oferta inferior a sua demanda em determinada economia. A economicidade nasce da percepção subjetiva dos agentes econômicos que determinado bem é escasso ou tenderá a escassear no futuro. A partir dessa escassez material ou projetada, os agentes econômicos maximizam a sua utilidade e acumulam esse determinado bem econômico em sua previdência, e tenderão a estabelecer nexos causais cada vez mais complexos, com o fim de estabelecer uma produção constante para atender suas necessidades presentes ou futuras. Essa percepção só é possível através do cálculo econômico microfundamentado, parametrizado através de preferências de bens relativos para cada agente, ou seja, a economicidade de um bem poderá ser relativa a depender da localização geográfica ou até mesmo a condição de bem poderá mudar de um indivíduo para outro. Enquanto determinado objeto, por exemplo, possui uma utilidade para o indivíduo X, não possui nenhuma valia para o indivíduo Y, uma vez que a sua utilidade não o causa nenhuma satisfação adicional.
Tendo o conceito de economicidade em mente, vamos introduzir o conceito de valor na teoria econômica mengeriana. Menger começa estabelecendo que, se a demanda de um determinado bem for maior que a quantidade disponível do mesmo (se um bem for econômico), para consumir uma unidade adicional deste bem econômico, teremos que deixar de consumir outros bens que satisfazem outras necessidades. Portanto, nessa situação, se eu quero consumir uma unidade adicional do bem "X", que é um bem econômico, eu terei que deixar de consumir uma unidade de outro bem econômico, digamos que é o bem "Y". Ambos os bens são econômicos, portanto, tendo em vista que o agente econômico, em circunstâncias reais, possui como limitador a própria materialidade e limitação de todos os recursos que circundam a produção de bens econômicos, quando um indivíduo decide concentrar seus esforços para com a produção de um bem específico, ele estará abrindo mão de bens de ordens superiores (que poderiam estar sendo utilizados em outras cadeias produtivas, em nexos causais diferentes), tempo, energia, e, em uma economia de mercado, outros bens que ele trocaria por uma infinidade de sortes de produtos. Portanto, a situação caracteriza-se como um "trade-off", onde o agente econômico, por priorizar a satisfação de uma determinada necessidade, escolhe destinar seus esforços para a obtenção do bem econômico em questão e abdicar o angariamento de outro bem, que satisfaria outras necessidades que o indivíduo não considera tão premente como a primeira. A situação também pode ocorrer de forma quantitativamente diferente, por exemplo, o agente econômico em questão poderá satisfazem ambas as necessidades, possuindo tanto o bem "X" quanto o bem "Y", porém, como a satisfação possui uma característica qualitativamente diferenciada, os indivíduos sentem necessidades de bens distintos em quantidades distintas, portanto, ele escolherá uma necessidade para satisfazer com maior empenho, enquanto as outras necessidades que o indivíduo poderia saciar utilizando o empenho para satisfazer a necessidade primeira, são mantidas satisfeitas de forma parcial.
Menger então continua: "No momento em que as pessoas (envolvidas em atividades econômicas) se derem conta deste fato, e, por conseguinte, perceberem que o atendimento de uma de suas necessidades concretas está na dependência de qualquer parcela que consumirem do respectivo bem, esses bens adquirem, para essas pessoas, o significado que denominamos valor". Então, por mais óbvio que pareça, o valor é uma consequência natural da economicidade, esses dois conceitos estão intrinsicamente unidos. A economicidade é consequência natural da demanda sobrepujando a oferta, seja por limitações da própria oferta, seja pelo ímpeto expansivo da demanda. O valor surge como uma medida comparativa, e possui uma dimensão valorativa mais personificada, uma vez que um bem, para se considerar como tal, necessita de potência para transformar um estado de necessidade em um estado de saciedade, portanto, um bem econômico (escasso) é indissociável do conceito de valor, uma vez que, para se reconhecer que o bem é econômico para "X", esse indivíduo terá que considerar tal objeto um bem, ou seja, enxergar uma dimensão utilitária para com seu estado de necessidade presente ou vislumbrar um futuro, e, além disso, precisa enxergar através do cálculo econômico microfundamentado, uma sobrepujança da demanda por esse mesmo bem (com outros agentes enxergando tal objeto como bem e estocando-o) frente à oferta (seja pela produção deste bem ainda não ser tão desenvolvida, não for estabelecidos tantos nexos causais e, consequentemente, tornando o processo produtivo mais limitado e letárgico), com isso, todo bem econômico (na visão de um sujeito que o considera como um bem e o vislumbra como econômico ou potencialmente econômico) possui a dimensão que Menger denomina de "valor" em algum grau. O valor necessita que o agente tenha consciência que a sua necessidade só poderá ser saciada a partir de uma porção concreta de determinado bem, ora, é necessário que um indivíduo considere-o como um bem econômico em si.
O reconhecimento da economicidade e, consequentemente do valor relativo que determinados bens possuem para determinados agentes, estimula a previdência, facilitando a maximização da utilidade por ele proporcionada e, a depender da valoração no mercado, o ímpeto pela reprodução em massa desse bem para ser vendido no mercado, de forma que, com o passar dos anos e o estabelecimento de nexos causais, profissionalização, tecnicidade e especialização, esse bem, que antes era econômico, poderá vir a ser um bem não econômico, perdendo seu valor em seguida. Mas vê-se que a produção e economicidade andam lado a lado. Só a partir da propriedade e previdência que os homens são impelidos a reproduzirem bens não econômicos. Impulsionados pela satisfação de suas necessidades, em um mercado livre amplo, se tornam fornecedores e satisfazem as necessidades de muitos outros indivíduos. O ciclo de acumulação e gozo, caracterizados como ciclos econômicos são iniciados com certos empreendedores acumulando e produzindo (maximizando a utilidade) de bens econômicos, levando uma expansão da oferta, que é acompanhada paulatinamente pela demanda (uma vez que os agentes econômicos costumam a ampliar suas necessidades em tempos de bonança).
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