Os bens em Menger classificados e a utilidade como um conceito relativo. Um bem para mim pode não o ser para você.

§2. O nexo causal existente entre os bens: Menger, então estabelece no segundo parágrafo de sua obra "Princípios", que, para que possamos verdadeiramente conhecer as leis naturais que perpassam a ciência econômica, não é necessário entender os objetos de estudo da mesma sobre a perspectiva atomizada, ou seja, os estudos voltados para a ciência econômica devem concatenar as leis que regem os objetos de estudo da Economia. Menger aqui estabelece um parâmetro empírico no estudo dos fenômenos econômicos, validando-o assim não como uma ciência isolada e hermética, que busca entender as complexidades da Ciência Econômica fechada em si mesma, mas sim perante os nexos causais que a interceptam, ou seja, a relação desses bens com os homens

Já expliquei aqui a relação entre os bens, dos estados de satisfação e das forças utilitárias que constituem essa relação entre os próprios bens e os estados de necessidade/satisfação. Agora, Menger, a partir do nexo causal (lembrem-se, o nexo causal que torna um bem o que ele realmente é, nada mais é do que a sua utilidade e a capacidade de transformar um estado de necessidade em um estado de satisfação), categoriza os tipos de bem com relação ao quão diretamente um bem pode satisfazer as necessidades humanas. 

Portanto, denominamos bens de primeira ordem as coisas que podemos estabelecer um nexo causal direto com a satisfação das nossas necessidades. Se eu estou com fome, por exemplo, o pão é um bem de primeira ordem. 

Os bens de segunda ordem, são assim chamados pois conseguem produzir bens de primeira ordem. Ou seja, eles atendem indiretamente às necessidades humanas. O forno do padeiro e a farinha de trigo considerados bens de segunda ordem, por exemplo.

Eles são assim distinguidos pelo fato dos bens de primeira ordem apresentarem um nexo causal direto para a satisfação das necessidades humanas. Exemplo: Fome -> Pão -> Satisfação. Agora, os bens de segunda ordem possuem um nexo causal indireto com relação com as satisfações das necessidades humanas. Exemplo: Fome -> Farinha -> Pão -> Satisfação. Geralmente não comemos farinha pura, não a de trigo, as vezes a de mandioca.

Vê-se que para ser considerado um bem (possuir utilidade e, com isso capacidade de transformar um estado de necessidade para um estado de satisfação) não é necessário que o vínculo entre a coisa em si e a satisfação seja direto. Portanto, podemos sim chamar de "bens" os bens de segunda ordem.

Agora, nessa linha de raciocínio, temos os bens de terceira ordem. Para ilustrar na mesma linha do exemplo anterior, os moinhos de cereais, o trigo e o centeio são considerados bens de terceira ordem, uma vez que eles são úteis para a satisfação das necessidades humanas na medida que eles produzem bens de segunda ordem. E os bens de segunda ordem são úteis para a satisfação das necessidades humanas na medida em que são ingredientes necessários para produzir bens de primeira ordem, e esses possuem um nexo causal direto com a satisfação das necessidades humanas.

Menger continua ainda essa linha de raciocínio, introduzindo o conceito de bens de quarta ordem, que seriam os campos de trigo, instrumentos necessários para o processamento do trigo e etc.

O autor então expressa o que ele realmente quer dizer ao introduzir essas diferenciações entre as ordens de bens segundo o nexo causal entre a sua utilidade e a satisfação das necessidades humanas: "não é condição para que uma coisa tenha qualidade de bem poder ser colocada em nexo causal imediato com a satisfação de necessidades humanas". Ou seja, essa afirmação expande o horizonte que o autor explicitou no primeiro parágrafo de seus "Princípios". Uma vez que para que uma coisa seja considerado bem, não é necessário que esta possua nexo causal direto com a satisfação das necessidades humanas, o universo em que tratamos os bens expande-se sobremaneira.

Ele ainda deixa mais claro, reforçando a classificação desses bens: "entre esses bens que têm nexo causal apenas indireto com a satisfação das necessidades humanas, existe uma diferença (embora sem afetar a qualidade básica de "bem"), na medida em que essas coisas têm nexo causal, ora mais direto, ora menos direto, com o atendimento de nossas necessidades". Aqui, Menger deixa claro que pouco importa se o moinho não pode satisfazer as minha necessidades diretas, nem por isso ele deixará de ser considerado um bem, uma vez que ele, indiretamente, poderá fabricar farinha de trigo, que está poderá se transformar em um pão.

Resumindo: Um bem só poderá angariar essa condição uma vez que ele consiga, a partir de sua utilidade, satisfazer direta ou indiretamente as minhas necessidades (transformando um estado de necessidade em um estado de satisfação)

No final do capítulo, Menger diz algo muito importante, e que norteará a sua teoria do valor, que veremos nos próximos parágrafos. Ele fala que a "utilidade", essa característica que define o que é um bem e o que não é, NÃO É INERENTE DO BEM EM SI, MAS SIM UMA PROPRIEDADE DO NEXO CAUSAL. Ou seja, para que haja um nexo causal que demonstre essa utilidade do bem, sempre dependerá, para o bem mostrar-se compatível, que a necessidade possa ser direta ou indiretamente satisfeita com essa coisa (bem em potencial). Algo que para mim possa ser um bem, pois alguma necessidade minha se satisfaz com a utilidade que, diretamente ou indiretamente esse bem possui, para outra pessoa poderá não ter utilidade alguma.

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