PMI da Arábia Saudita, especulação ou crescimento real? (05/11/2023)

 O indicador de PMI da Arábia Saudita S&P Global/Riyad Bank mostrou uma expansão da atividade do setor privado saudita, que já se encontrava alta anteriormente, marcando 57,2 pontos em setembro e 58,4 pontos em outubro. A Arábia Saudita se encontra com o PMI acima de 50, que indica expansão desde setembro de 2020, indicando uma recuperação quase que "relâmpago" da pandemia. Mesmo sendo a economia saudita muito dependente do petróleo, o movimento do PMI não teve muita relação com o preço da commodity se utilizarmos o gráfico para efetuar a comparação.

Sobre o PMI de outubro, podemos destacar os seguintes pontos importantes:

1) O crescimento do emprego atinge a maior alta em nove anos. A taxa atual de desemprego na Arábia Saudita é de 4,9%, a mais baixa desde 2001. O mercado de trabalho forte retroalimenta a demanda interna, criando um "ciclo harmonioso" de trabalho e consumo.

2) No mês de outubro, mesmo com a demanda global ainda se recuperando, porém, em patamares historicamente fracos, a demanda interna saudita se mantém forte. Para acompanhar esse movimento interno, as empresas aumentaram suas atividades de compras,  resultando em estoques maiores, que se traduzem na confiança dos empresários de que a demanda continuará aquecida, apesar da incerteza da demanda externa. Isso significa que a economia saudita se mantém na contramão de boa parte do mundo, onde, para controlar a inflação, a maioria dos países estão se vendo forçados à aumentar a taxa de juros, diminuindo a inflação, mas consequentemente a demanda agregada, fator que gera o aumento da atividade. Como a Arábia Saudita é um grande "player" no mercado de petróleo, não está tão preocupada com possíveis choques no preço do petróleo, e, ainda mais, em um possível cenário de conflito no Oriente Médio, a Arábia Saudita se beneficiaria (claro, se conseguirem estabelecer tratados que consigam dar continuidade na sua cadeia de suprimentos) de preços altos do petróleo.

3) O governo, através do PIF (Public Investment Fund) continua a estimular o setor privado e o mercado de títulos mobiliários.

4) Mesmo com movimentos inflacionários no mercado de trabalho e nos insumos utilizados nas produções das fábricas, as empresas não estão repassando esses custos para o cliente final, principalmente devido ao ambiente de competição experimentado no país.

5) Podemos enxergar um crescimento sólido do setor não petrolífero, que é uma meta estabelecida pelo "Vision 2030".

6) As projeções sauditas para o crescimento do setor não petrolífero são de 5% no ano de 2023, um número impressionante, tendo em vista as condições macroeconômicas.

A economia saudita, vem a alguns anos, através de uma série de medidas estruturais implementadas pelo setor público em parceria com o setor privado, estimular o crescimento através de incentivos em setores não petrolíferos. O projeto culminou em uma série de metas, estabelecidas no estamento "Vision 2030". A Vision 2030 é um programa que visa o desenvolvimento nacional da Arábia Saudita, promovendo  a entrada de capital estrangeiro, estabelecendo um ambiente amigável aos negócios e desburocratizado, tentando desnudar alguns paradigmas relativos ao Oriente Médio, que por muito tempo, foi conhecido por um lugar instável, com uma insegurança jurídica, política e social imensas.

Através do aparato macro do Vision 2030, e arcabouçado por outras ferramentas de intervenção diretas, como a modernização do Saudi Arabian General Investment Authority (SAGIA), criado em 2001, e responsável por regulamentar os investimentos dentro do país e a criação do Public Investment Fund (PIF), que é um fundo de investimento público que impulsiona a diversificação da economia saudita. Enquanto o SAGIA, a partir da desburocratização do ambiente econômico saudita, atrai investimento estrangeiro, principalmente de fundos bilionários que recentemente saíram da China por conta de problemas internos daquele país, o PIF estimula a diversificação a partir do investimento público em empresas privadas (o PIF detém participação relevante na empresa de tecnologia Uber, e também investe em empresas que exploram fontes renováveis de energia, como a ACWA Power).

O crescimento saudita parece ser sustentado, pelo menos no curto prazo. Um fenômeno que precisa ser acompanhado de perto, principalmente nos retornos reais desses investimentos. Se há uma formação de "bolha" devido aos excessos de investimento em ativos que não possuem uma contrapartida real, em outras palavras, especulativos, o crescimento saudita pode estar fadado ao mesmo fracasso do Japão nos anos noventa. Por enquanto, a Arábia Saudita se destaca do resto do mundo pela sua resiliência econômica, abundância de petróleo, forte demanda interna e capacidade de atrair investimento exterior. Vamos seguir acompanhando de perto.

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